É uma embalagem plástica da Paperchase, de 6x7 cm, contendo 10 cartões dentro de 10 envelopes, feitos de resíduos da produção de algodão. Atrás, meio descolando, tem uma etiqueta de preço (imagina, usava-se etiquetas de preço na época, não códigos de barras), indicando: €4,94.
Não lembro de ter comprado os envelopinhos, mas sei exatamente por que os comprei: são fofos, lindos, artesanais, diferentes. Por certo compraria de novo hoje mesmo se os visse numa papelaria, mesmo incerta de como usaria.
Eu não lembrava que tinha esses envelopes. Na última ida a São Paulo, encontrei ele com umas coisas minhas que mamãe ainda guarda (e como ainda tem coisa minha na casa da minha vida….), e trouxe eles comigo para Porto Alegre. Desde então, já usei dois cartõezinhos, e o curioso é que ainda restam 9 na embalagem.
Fiquei pensando o que me levou a colocar esses envelopes na mala que veio comigo para o Brasil quando a vida que eu conhecia acabou e eu vim começar outra. Meu espaço era limitado; éramos eu, um bebê de 18 meses, um carrinho de bebê e duas malas. Muita coisa ficou pra trás, e até hoje não sei que fim tiveram meus DVDs de Bollywood, meus livros e sabe lá mais o quê, pois, sendo honesta, já passou tempo demais e não sei o que não coube na mala.
Mas por algum motivo os cartõezinhos vieram. Chegaram intactos, nem um amassadinho, nem nos cantos. Devo ter tirado eles da mala sem nem perceber, colocado numa gaveta e ali ficaram até dezembro de 2024.
Por que será que pareceu importante que eles viessem comigo? Que pensamentos minha mente, na época fragmentada pelo puerpério, pelas noites sem dormir, pelo coração partido, o medo do que viria adiante e a depressão que só descobri e tratei um ano depois, formou para que minha mão fosse até a embalagem de plástico transparente valendo menos de 5 euros e julgou aquilo necessário?
Com frequência sonho que estou arrumando malas, ou procurando roupas ou objetos meus e é um trabalho que não dá certo de jeito algum: coisas somem, sou interrompida, nada do que tem nas minhas gavetas e armários é meu, não sobra tempo e tenho que sair sem as coisas, até mesmo sem mala alguma.
Mas eu falava dos cartões. Me pergunto se são uma chave de portal e deveriam me levar a outro lugar. Ou um tipo de horcrux, guardanado uma parte da alma de quem eu era quando os comprei, provavelmente entregando uma nota de 5 euros e deixando o troco naquelas cestinhas que ficam ao lado do caixa. Caso sejam, falharam, porque sigo sem memória alguma desse encontro.
Saudades da Paperchase! Em um ano de Inglaterra eu acumulei tanta tralha que precisei pagar uma mala extra pra trazer tudo de volta: arquivo de papelão decorado, estojo, um kit lindo decorado com o símbolo da London Underground, contendo régua, estojo de metal com estampa da malha metroviaria, lápis, apontador, régua, marcadores de texto (que só comecei a usar dez anos depois, mas ainda têm tinta); porta-lapis de metal que vive na minha escrivaninha até hoje, papel de carta, e um bloco enorme de folhas para planejamento semanal que deveriam ficar na minha escrivaninha, mas que nunca consegui usar. No máximo recortei algumas figurinhas londrinas pra usar numa colagem ou outra. Inutilidades que me trazem memórias daquele tempo bom e que ocupam minhas gavetas, mas que ainda pretendo botar em uso, um dia.
Eu fico pensando o poder que os trem de papelaria tem sobre a gente. "Uau esse cartãozinho, vou levar" (três anos que não escrevo a mão), "meu deus olha esse durex colorido que coisa linda" (nunca lembra dele pra embalar presentes), "ah, não esse caderninho eu pre ci so" (ele na pilha junto com os 46 amigos, todos em branco). Que poder é esse? É um sinal do nosso coração de que a gente precisa do manual e talvez lúdico pra ficar menos doida? Será que é um jeito de nos lembrar que o resgistro da nossa vida precisa ser feito? Sei lá. Eu achei uma graça os cartõezinho, a textura me pega super. ❤️